Das recordações juninas...


Das recordações juninas ...



Há muito só restaram as lembranças de um tempo do São João,em Itapetinga. Essas recordações me levam de volta à infância e nela vejo minha mãe se preocupando com a necessidade de nossas roupas e sapatos. Assim, os meses que antecediam à festa, aqueles mais próximos, eram ritualizados pela ida à loja de tecidos e de calçados. Não que tivéssemos direito aos dois itens. Eu a acompanhava para escolher o tecido do meu vestido. Ali começava meu São João. Mesmo que essa ida às compras me trouxesse o dissabor de passar por uma ladeira íngreme, da qual eu morria de medo. Sempre me via caindo e essa visão me paralisava. Era um esforço imenso chegar à uma loja de placa pequena onde se lia o nome “Evereste”. Talvez tivesse esse nome por causa do monte. Não sei. Aquele ponto comercial, na subida e/ou descida, passou a representar para mim um dos desafios que eu deveria vencer na vida.

Essas lembranças me levam a algumas ruas com suas palhas de coqueiro , as fogueiras “armadas”, esperando o grande momento, e o colorido das bandeirolas que dançavam ao som do vento frio de junho. Do ar, vêm as lembranças sensoriais marcadas pelo cheiro doce do licor de jenipapo, do “quentão” misturado ao aroma dos bolos, ximangos, avoadores, dos “assados” e demais iguarias que fazem parte dessa gastronomia junina À noite, nossos olhos espelhavam o resultado dos fogos quando esses espocavam em luz e festa celeste. As crianças vizinhas, com seus pais cuidadosos na vigília das brincadeiras com as “chuvinhas” , “cobrinhas”, “traques” nos seus efeitos pirotécnicos e sonoros , dos quais eu e meus irmãos éramos espectadores.

Outra alegria, era sairmos, crianças em grupo, numa expedição pelas ruas próximas à nossa rua Itaberaba, perguntando: “São João passou por aqui?” Depois de decidir em qual casa perguntaríamos e quem teria a coragem de fazer essa ação. Felicidade era regressar com os olhos lacrimejantes pela fumaça, o riso solto, as mãos cheias de pedaços de bolo e aquele biscoitinho de goma que dissolvia e grudava no céu da boca, Da casa de D.Matilde e S.Tuca, a radiola a tocar: “Olha pro céu meu amor(...)”; “Com a filha de João, Antonio ia se casar (...)”. A noite terminava com a certeza de que no próximo ano tudo se repetiria. E eu estaria com um vestido novo, estampado com flores e bordado de esperanças.

Hoje, da minha janela olho pro céu. A fumaça do tempo deixou as saudades e a gratidão pelos dias idos e vividos. São lembranças que alentam ,mas que também fazem sofrer, em especial, pela recordação daquelas e daqueles entes queridos que já fizeram a passagem.Outras lágrimas causadas por outras fumaças.Entre elas, essa pandemia que acentuou separações, proibiu abraços, escondeu nossas faces, interditou caminhos, embaralhou os dias e nossas ideias.Sigamos, nos cuidando e na fé em novos dias para que, em tempos juninos vindouros, possamos ouvir nossa criança interior a nos perguntar: “São João passou por aqui?”.





Terezinha Oliveira Santos
24.06.2020

Comentários

  1. Nossa Teca que texto receptível! Entrei nas suas lembranças sensoriais e vivi também as festas juninas na minha infância, que era na roça e meu pai fazia um forró lá em casa. Tinha uma fogueira enorme, ele pendurava laranjas nas árvores próximas da casa, fazia pau de cebo para os adultos... brincávamos com os filhos das pessoas que iam... Obrigada por tamanha emoção!

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  2. Que belo texto nos remete a memórias da infância,há infância querida que não volta mais rsrsrsrrs. Texto surpreendente, maravilindo!!!!!!!!!!!!1

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