sábado, 18 de julho de 2020

De um ponto comercial e seus doces...



Primeiramente, nos anos 70 , a mercearia ficava ali na rua Potiraguá, se localizava na esquina com a minha rua Itaberaba, depois, mudou-se para o lado oposto daquela rua e se instalou perto da casa de D. Adélia. Era uma casa comercial, com seus balcões de madeira, altos para a minha idade, de onde, em visão oblíqua, eu prestava atenção naquele senhor sempre sério a nos “despachar”. Aquele estabelecimento também representava as oscilações financeiras da minha casa. Minha mãe saía cedo para o rio Catolé, onde se juntava a outras lavadeiras em suas funções cotidianas de complemento da renda doméstica. 

Meu pai, funcionário do DERBA, geralmente estava pelos trechos, longe de casa, a trabalhar. Nos dias de dinheiro escasso, minha avó, a quem chamávamos afetivamente de “mãe véia”, juntava os valores ¬ gratificações que recebia das genitoras por rezar os quebrantos das suas crianças ¬ e me encarregava de ir comprar óleo, açúcar , café , a exemplo, em pequenas quantidades, ou a retalho como bem se diz. Minha mãe, ao chegar do rio, com as mãos castigadas pela água e sabão, encontraria num gole de café fresco um pequeno conforto.

 A ida à mercearia poderia ser feita num pequeno percurso, sempre sob as recomendações anciãs para “ir devagar”, “não correr”, não parar “na casa dos outros” e trazer o que se pedia. Frases imperativas parcialmente obedecidas. Para as crianças qualquer espaço geográfico pode se transformar no mais extenso e fantástico território. Ao chegar à “venda”, solicitava os itens recomendados e ficava a observar: a balança, os pesos sendo ajustados , o pó de café colocado sobre um papel pardo e os dedos hábeis de S. Vavá atando as pontas laterais da embalagem numa rápida dobradura que deixava o pacote em formato de uma meia lua. O mesmo acontecia com a embalagem do açúcar. O óleo, esse passava por um medidor e a quantidade depositada no copo dependia do valor mencionado pelo cliente. 

Ás vezes, na porta do estabelecimento, estava parado um caminhão e seu enorme baú, onde estava grafada em letra enorme a palavra “Neusa”. Havia uma beleza na distribuição estética desse substantivo e, especialmente, na sua letra “a”: essa vogal se estendia num prolongamento artístico enlaçando aquele nome e minha imaginação. Era o “carro dos doces”. Os homens a “descarregá-lo”, as caixas, os pacotes, a mercadoria que depois estaria exposta num baleiro __com várias divisórias de vidro e suas tampas de alumínio__ que girava como um carrossel a exibir seus doces coloridos em vários formatos e sabores: “Geleia”, “Maria-mole”, “peito de moça”, “atum”(risos). Tudo. Tudo e muito mais estava ali. 

Em casa, enquanto dormíamos, minha mãe ficaria parte da noite a passar a ferro. Talvez eu sonhasse e, no sonho,  saberia que , pela manhã, eu entregaria a roupa em seu destino e, se a patroa pagasse, minha mãe me daria moedas como uma pequena recompensa. A mercearia estaria a me esperar, eu correria pra lá, entraria... giraria aquele baleiro e, numa alegria inconfessável, diria: - Quero esse!





quarta-feira, 24 de junho de 2020

Das recordações juninas...


Das recordações juninas ...



Há muito só restaram as lembranças de um tempo do São João,em Itapetinga. Essas recordações me levam de volta à infância e nela vejo minha mãe se preocupando com a necessidade de nossas roupas e sapatos. Assim, os meses que antecediam à festa, aqueles mais próximos, eram ritualizados pela ida à loja de tecidos e de calçados. Não que tivéssemos direito aos dois itens. Eu a acompanhava para escolher o tecido do meu vestido. Ali começava meu São João. Mesmo que essa ida às compras me trouxesse o dissabor de passar por uma ladeira íngreme, da qual eu morria de medo. Sempre me via caindo e essa visão me paralisava. Era um esforço imenso chegar à uma loja de placa pequena onde se lia o nome “Evereste”. Talvez tivesse esse nome por causa do monte. Não sei. Aquele ponto comercial, na subida e/ou descida, passou a representar para mim um dos desafios que eu deveria vencer na vida.

Essas lembranças me levam a algumas ruas com suas palhas de coqueiro , as fogueiras “armadas”, esperando o grande momento, e o colorido das bandeirolas que dançavam ao som do vento frio de junho. Do ar, vêm as lembranças sensoriais marcadas pelo cheiro doce do licor de jenipapo, do “quentão” misturado ao aroma dos bolos, ximangos, avoadores, dos “assados” e demais iguarias que fazem parte dessa gastronomia junina À noite, nossos olhos espelhavam o resultado dos fogos quando esses espocavam em luz e festa celeste. As crianças vizinhas, com seus pais cuidadosos na vigília das brincadeiras com as “chuvinhas” , “cobrinhas”, “traques” nos seus efeitos pirotécnicos e sonoros , dos quais eu e meus irmãos éramos espectadores.

Outra alegria, era sairmos, crianças em grupo, numa expedição pelas ruas próximas à nossa rua Itaberaba, perguntando: “São João passou por aqui?” Depois de decidir em qual casa perguntaríamos e quem teria a coragem de fazer essa ação. Felicidade era regressar com os olhos lacrimejantes pela fumaça, o riso solto, as mãos cheias de pedaços de bolo e aquele biscoitinho de goma que dissolvia e grudava no céu da boca, Da casa de D.Matilde e S.Tuca, a radiola a tocar: “Olha pro céu meu amor(...)”; “Com a filha de João, Antonio ia se casar (...)”. A noite terminava com a certeza de que no próximo ano tudo se repetiria. E eu estaria com um vestido novo, estampado com flores e bordado de esperanças.

Hoje, da minha janela olho pro céu. A fumaça do tempo deixou as saudades e a gratidão pelos dias idos e vividos. São lembranças que alentam ,mas que também fazem sofrer, em especial, pela recordação daquelas e daqueles entes queridos que já fizeram a passagem.Outras lágrimas causadas por outras fumaças.Entre elas, essa pandemia que acentuou separações, proibiu abraços, escondeu nossas faces, interditou caminhos, embaralhou os dias e nossas ideias.Sigamos, nos cuidando e na fé em novos dias para que, em tempos juninos vindouros, possamos ouvir nossa criança interior a nos perguntar: “São João passou por aqui?”.





Terezinha Oliveira Santos
24.06.2020

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020




                             Carnaval de Salvador: um recado, em baianês, para os turistas “desavisados”!!!

Rapaz! Se tem uma coisa que me deixa retada, é injustiça!! Aí, a mídia anuncia o carnaval de Salvador, mostrando a animação pré-carnavalesca e a pessoa vem me dizer que “ esse povo de Salvador só vive em festa”. Ora, pra bom entendedor ou entendedora, isso significa que o soteropolitano não tem o que fazer... ou aquela velha idiotice de que o povo baiano é preguiçoso. Dá vontade de “picarláporra...véi!"

Sendo assim, quem é que vai limpar as merdas, os xixis derramados pelos banheiros? Quem fará a comida para abastecer a vossa barriga, quando vocês chegam aqui, tudo esfomeados, por que não conhecem fartura? Quem tomará conta dos seus filhos mimados, mal-educados? Sim, porque têm muitas mães que só suportam os filhos na hora de tirar foto... são as babás, as “mães pretas” que sempre estão a postos. Estou mentindo? Quem cuidará dos seus pets? Todo mundo adora cachorro...sei, bem sei! 

Quem tomará conta da geriatria? Dos velhos e velhas caducas, que a maioria só diz gostar quando é para se aparecer no Facebook, ou pegar o dinheirinho da aposentadoria dos trastes!  Deus tá vendo sua extorsão!! Quem tomará conta daquele seu parente internado? Porque, às vezes, “as mizera”  dos parentes só adoecem na hora errada.  Quem vai abastecer os bares de bebida, lhe servir “mais uma”, a “de Jair” (crendesupai)? A “saideira”? Aguentar sua cachaça enjoada? "Rebâim de mizera!!!"

 Claro que estou falando do trabalho de uma galera que dá graças a Deus quando chegam esses dias.Apesar da humilhação. Sabe por quê? Porque precisam manter a dignidade, tantas vezes ameaçada em nome da limpeza étnica institucionalizada pelo biopoder...pela necropolítica! Se você já leu Achile Mbembe, Michel Foucault, sabe do que estou falando. Se é do tipinho que só busca as imagens nos textos, que lute para entender, “sinha disgraça”!!!   

Cada uma, viu?  

Ainda têm uns héteros que vêm loucos, de tudo quanto é lugar, alguns atravessam o Oceano, em busca do “negão” ou da negona (diabo de fetiche duzinferno!). O oposto também pode acontecer, claro! Vão se encontrar? Vão! Claro que vão, porque na cidade mais negra, fora de África, há corpos disponíveis e outros, não!  Depois de receber sacos no queixo, voltam, homofóbicos, para seus lares, para as “mulheres de Atenas” (será?) e ainda   saem  falando que não gostam de preto, que preto fede.. que é isso e aquilo. A quilo!  Me faça uma garapa, viu! 

Claro que estou falando de racismo, da hipersexualização das mulheres e homens negros, mas isso aí vocês já estão cansados de saber qual é a finalidade dessa estereotipia, nessa engrenagem da desumanização colonialista.. se você já leu Frantz Fanon me entenderá melhor, se não.. vá se informar, para não ficar igual ao ministro “boca de afofô”. Ministro da Educação! Kakaka! 

Eu quero é prova (esse é o outro, o conge) e um real de big-big...bang..bang! Estou pensando no edi de Queiroz! Rapaz! Deuzémais!!
Reflexões! Carnaval em tempo de “Covid-19”! Use máscara nessa cara de pau.. aí também, use camisinha!!
No mais, “(...) que bom você chegou!! “
Bem-vindo a Salvador....!

Terezinha Oliveira Santos
(Teca Santos)
14.02.2020






sábado, 1 de fevereiro de 2020


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Casal texto


Em nossa vida acadêmica, somos "obrigados" a ler muitos livros . Às vezes, nessas leituras, não basta acessar a língua portuguesa. Temos que enveredar por outras compreensões das línguas estrangeiras. Isso é importante! São, também, demonstrações de conhecimento que transitam entre as relações de poder e as "fogueiras de vaidade", peculiares àquele ambiente. Entretanto, há lições, há textos que estão disponíveis no nosso cotidiano, impressos em gestos e, por pessoas comuns, pessoas ordinárias ou melhor, pessoas extraordinárias.

Graças ao Orun, tenho sido abençoada porque tenho esses textos bem perto de mim e, na alfabetização, nesse processo de (con)vivência , essas pessoas têm-me ensinado lições que não cabem em nenhum livro, não podem ser traduzidas por nenhuma ferramenta, analógica ou digital, porque escritas na linguagem do amor, com caracteres invisíveis, tamanho multidimensional, Fonte sentimental, capitular. Textos que só olhos que podem ver conseguem enxergá-los , compreendê-los, interpretá-los dadas às suas sutilezas. 
 
Esses textos requerem sensibilidade, sensorialidade e, quando digo "olhos que podem ver", estou me referindo à terceira visão,que paradoxalmente, pode ser acessada pelos visuais e pelos não-visuais. Das minhas leituras, destaco o casal/texto Édina Soraya(Dine) e Gean e nele vou corrigindo,ampliando, revendo minha compreensão da palavra cônjuge. Essa palavra pode nos provocar riso, quando a conectamos a uma certa figura pública, eu sei, mas, ela também pode-nos levar a reflexões. 

Dine e Gean me fazem acreditar na possibilidade das uniões. Não vou utilizar a palavra estável porque seria uma incoerência.Durabilidade e estabilidade são coisas diferentes. As uniões nunca são estáveis, porque sujeitas aos abalos íntimos e externos da sociedade, em especial, do núcleo familiar, em suas imperfeições, colaborações, problemas, soluções, confusões, tudo que faz parte do humano, do demasiado humano. 

Penso que Dine e Gean podem-nos ensinar que casamento é a soma de todos os medos, mais que nome de filme, isso significa que somos seres da errâncias e acertos, vitórias e fracassos , mas que juntos podemos encontrar o equilíbrio, ou equilíbrios. É preciso coragem! Casamento é mais que festa, álbum de fotografia, dancinha coreografada, festa parcelada em cartão de crédito até o Apocalipse. 

Gean e Dine, juntos, corajosos, têm-nos ensinado muita coisa e , nesse tempo que eles têm para se amar , é tanto amor, que ainda sobra sentimento para cuidar dos amigos.Juntos!
Esse texto é uma das formas que encontrei para expressar a minha gratidão, queridos! 
Muito obrigada!
 


#Saúde!
#Bençãos!
#Felicidades!

A Casa de D. Tiana!

                              É comum ouvirmos, em relação à escola, essa frase;" é a minha segunda casa".   Não discordo, cada um...